Você acredita que o problema do transporte de João Pessoa vai além do superficial. Conte como os vícios ocultos do atual sistema de linhas influem nos problemas que as pessoas enfrentam hoje.
Pergunta feita por este editor
O maior vício oculto do sistema pessoense é acreditar, como eu contei em outra pergunta deste mesmo tema, que os problemas podem ser resolvidos com mais ônibus em uma determinada linha ou que esses ônibus sejam de última geração, e fica por isso mesmo. Você pode ter o veículo mais moderno do mundo, mas se você não investe na estrutura, esse mesmo ônibus novo que você vai andar terá os mesmos problemas de lotação, congestionamento no trânsito, atrasos e todos os vícios que existem porque não pensaram em uma coisa: alterar a estrutura do sistema. E aí a gente fica nesse círculo vicioso por anos e anos. Nada mais adequado do que essa metáfora para um sistema que força o passageiro a circular.
Aí a gente entra na pergunta anterior, que é sobre o sistema ser antigo e não ter acompanhado as mudanças de dinâmica dos bairros, além de não levar em conta que outros bairros iriam surgir, mais distantes do Centro. Se esqueceu de investir em um transporte de massa de verdade, prevendo a explosão populacional, e sobrou para o ônibus fazer esse papel. E eu tinha esquecido justamente de um detalhe no outro post, mas eu vou contar nesse: não tem como um sistema projetado para uma população de 50 mil pessoas servir para uma população de quase um milhão de habitantes. Se você não toca nessa ferida, não se resolve nada nem trocando de empresa achando que essa ou aquela é ruim. Parem de acreditar que é apenas isso!
Essa talvez seja uma das coisas que a antiga Setusa acabou absorvendo da cultura do arrodeio, a de criar linhas circulares. Só que tirando as linhas 2300 e 3200, que não mudaram muita coisa nesses 35 anos que existem, as 1500 e 5100 foram totalmente descaracterizadas desde que foram transferidas para a iniciativa privada, e hoje rodam demais, além de praticamente escancarar a desigualdade de quem, mesmo com um ônibus, precisa andar quilômetros e parar em várias paradas para chegar ao seu local de trabalho e estudo, sendo que a mesma linha de ônibus em alguns bairros é uma linha curta para tal.
E depois se criou o vício das circulares de bairro, juntando e extinguindo linhas radiais para substituir por linhas que não faziam o seu papel objetivo, pelo contrário, forçavam o passageiro a ir ao Centro e a pegar um corredor inteiro mais a soma do que já estava, quando alternativas como o Terminal do Varadouro já poderiam ter sido criadas lá atrás. E quando foram criadas, mantiveram as mesmas linhas que já paravam lá na época do Terminal Urbano e não moveram as linhas que retornavam da Lagoa. Não falo isso de agora, no formato do pós-pandemia. Digo isso sobre quando fizeram o terminal lá em 2005, e ainda sobrecarregaram o mesmo quando podiam ter feito mais terminais em outros pontos-chave da cidade.
E porque eu digo que esses são vícios ocultos? Porque a gente não imagina que esses pequenos detalhes, que a gente acredita que não precisam ser mudados, estão na raiz dos problemas. Mas estrutura do sistema é uma coisa que ninguém vê e não dá voto, ao contrário de investir nas frotas, onde se apresentam os ônibus em uma solenidade e se diz que diminuir a idade média da frota está ótimo e não precisa de mais nada. O problema é que ninguém tem coragem de tocar nesses vícios ocultos, nem na cultura do arrodeio. Se prefere fazer auê em torno de coisas que sempre fizeram lá atrás como se ninguém soubesse o que fizeram nos verões passados.
Os problemas que as pessoas enfrentam hoje no transporte público de João Pessoa não estão apenas no que se vê na questão da qualidade da frota. Está onde as pessoas não querem tocar, e nem muito menos entender que os seus deslocamentos podem ser melhores sem esses vícios ocultos. E eu nem mencionei todos esses vícios ocultos em detalhes, só quis resumir os principais pontos para não ficar cansativo de ler para quem quiser entender. E talvez eu tenha contado outros nas outras perguntas que eu respondi nessa semana, porque são tantos que a resposta desta pergunta seja mais longa do que ela já está sendo.
E mais uma vez usando as minhas metáforas loucas, que eu gosto de usar para que as pessoas entendam com uma história simples tudo o que eu contei em forma desse texto, eu comparo a estrutura do sistema radiocêntrico de linhas e corredores usado hoje em João Pessoa a uma árvore que está doente pela raiz, mas as pessoas não notam porque esperam que as folhas amarelas caiam para que novas surjam, enquanto essa árvore, que para quem não percebe a fundo parece saudável, agoniza silenciosamente. Se essa árvore não caiu, para elas está tudo bem. Elas só vão entender quando essa árvore cair.
Este é o tema “Conhecendo Você”, o primeiro post do dia no Site Josivandro Avelar, com perguntas que eu respondo sobre temas de autoconhecimento e cotidiano. Inicialmente elaboradas por inteligência artificial, as perguntas passaram a ser elaboradas por mim e pelo público através dos canais de contato e redes sociais.
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